"Correio da Manhã", 10 de Janeiro de 2006
A face estava roxa, a roupa ensopada em urina e a barriga apresentava assaduras – foi assim que um morador de Azóia, em Sesimbra, encontrou Leandro, um bebé de seis meses que morreu na última segunda-feira, dia 2, ao que tudo indica vítima de asfixia com o próprio leite.
A Polícia Judiciária de Setúbal está a investigar a mãe, Patrícia, de 20 anos, que terá deixado o biberão na boca do bebé cerca das seis da manhã de segunda-feira da semana passada e só voltou a ver o filho pelas 14h00 do mesmo dia. Leandro já estava morto. Enquanto as investigações prosseguem, foi-lhe retirado o outro filho, ano e meio, que se encontra agora à guarda de uma tia.
Patrícia Pires vive desde os 16 anos com o pai das crianças, um pescador de 30 anos. Mas só há dois meses moram numa pequena casa arrendada na Azóia, em Sesimbra. Naquela segunda-feira, dia 2, o marido foi trabalhar, pelas 06h00, e Patrícia deu um biberão de leite ao filho de seis meses. “Ele costumava dormir muito e eu deixei-o estar. Fui vê-lo às 14h00 e estava morto”, disse Patrícia, ontem, ao CM.Patrícia garante que o filho não sofria de problemas de saúde e diz não saber o que aconteceu. Mas, segundo testemunhos recolhidos no local, os médicos do INEM puseram a hipótese de “o bebé ter morrido vítima de asfixia com o próprio leite”. “Parecia prática corrente a mãe deixá-lo a mamar no biberão sozinho, apoiado por uma almofada”, denunciou um dos moradores. Quando Patrícia se deparou com o filho já morto, pegou-o ao colo e foi para a rua gritar. O morador que a socorreu, que prefere manter o anonimato, disse ao CM que “o bebé estava roxo do nariz para cima”. O vizinho perguntou a Patrícia se ela tinha deixado cair o bebé, ela negou. “Segui as indicações do 112, fiz-lhe massagens cardíacas. Ainda estava morno, mas já estava morto”, disse.
Uma equipa do INEM foi ao local e deparou-se com “sinais de mau ambiente familiar e falta de higiene”, disse fonte do INEM, que adiantou ter chamado de imediato a GNR.
O outro filho do casal, uma criança de um ano e meio, foi entregue à tia, Francisca Coito. “Nunca presenciei maus tratos físicos, mas é verdade que a Patrícia não tinha os cuidados necessários com os dois filhos”, disse ao CM. Leandro foi enterrado na última quarta-feira, depois de autopsiado. A tia critica o facto de ainda não se saber os resultados. “É preciso saber o que aconteceu, para que o menino seja entregue definitivamente a mim ou à mãe”, disse.
CRIANÇAS NÃO ESTAVAM SINALIZADAS
Antes de viverem em Azóia, Patrícia e o marido estiveram em Inglaterra e, depois, moraram em Setúbal. Há cerca de três meses, uma proposta de trabalho levou-os para a uma pequena casa, nos arredores de Sesimbra, perto da residência de Francisca Coito, a tia do pai do bebé. “Quando souber que não foi ela, peço-lhe desculpa. Até lá, apenas a condeno pela falta de afecto e de cuidados de higiene que tinha com os filhos”, disse Francisca Coito que agora tem a seu cargo o outro filho do casal, de um ano e meio. “Está pouco desenvolvido, não fala. Desde que está aqui, já está mais extrovertido”, disse uma outra familiar, que acusa Patrícia de “não tratar dos filhos nem da casa”. A Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco de Sesimbra garante que Leandro não estava sinalizado como uma criança em perigo. Como medida de prevenção, até se concluir a investigação sobre a morte de Leandro, deu-se duas hipóteses à família: entregar a criança a uma instituição ou à tia. Francisca Coito afirma que vai fazer tudo para que o sobrinho fique bem. “Eu tomarei conta dele sem problema nenhum”, disse. Leandro ficará sob a sua responsabilidade, pelo menos nos próximos 30 dias, podendo ser visitado pelos pais.
BLOCO DE NOTAS
LETÍCIA
O último caso de um bebé maltratado, foi o de Fátima Letícia, a bebé de dois meses internada em Dezembro último vítima de maus tratos e violação por parte dos progenitores. Os pais estão em prisão preventiva.
LEI
Caso se confirme que Patrícia Pires foi negligente, arrisca uma pena de prisão até três anos pela morte do filho, Leandro, um bebé de seis meses. A lei prevê, em caso de negligência grosseira, pena de cinco anos.
RELATÓRIO
Segundo o relatório de 2004 da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco foram instaurados 4405 processos por negligência familiar. As comissões acompanharam 868 crianças até aos dois anos.
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